domingo, 25 de outubro de 2009

Seria a ação do espírito de nosso tempo?

Acredito que esta seja a minha terceira mensagem postada tendo por título uma indagação. Talvez seja coincidência ou então pura necessidade em dias que as pessoas se recusam a raciocinar, a problematizar a realidade.

Única questão que importa para muitos, é a encontrada em provas de concursos públicos, primeiro passo para uma vida profissional “segura” – segundo o Folha online, um concurso para vagas de gari no Rio de Janeiro atrai doutores e mestres, além de dezenas de milhares candidatos estudantes e graduados em curso superior. Deixo a digressão; volto ao ponto principal.

Tomo conhecimento de uma notícia, no mínimo, incrível. O governo vai propor ao Congresso Nacional algumas mudanças na lei antidrogas. Entre elas consta a que livra o pequeno traficante da prisão. Caso seja abordado com uma quantidade não significativa de drogas – o quanto é significativo? –, não esteja armado e não tiver ligação comprovada com o crime organizado – organizado em qual nível? –, agindo esporadicamente – o que significa isto? –, será condenado a penas alternativas. Estariam, assim, fora dos tentáculos do crime organizado na prisão. Belo raciocínio, mas...

Uma questão relevante é: qual o impacto positivo da pena alternativa sobre o indivíduo? Seria o suficiente para resgatá-lo da criminalidade – ainda que “pequena” e “desorganizada”?
Acho a medida um tanto quanto frágil e utópica, dada a nossa realidade. Nascido e morador de periferia, acompanhei e vejo o desenvolver desse câncer que é o tráfico. Suspeito de que a proposta do governo é equivocada e não atinge o problema como deve ser. Crer que o fato de deixar um pequeno “comerciante” de drogas fora da prisão, cumprindo pena alternativa é o suficiente para aliviar a gravidade das drogas ou é delírio ou é ingenuidade. Ou, talvez, uma perversidade inconsciente.

O único ponto apreciável da proposta diz respeito à preocupação em não deixar o traficante dentro das estruturas de “ensino” criminoso das prisões brasileiras. Aliás, talvez o governo não entendeu ser uma confissão de total ineficácia do sistema prisional ao propor tal mudança. Mais uma vez tenta mostrar serviço com uma medida estapafúrdia e que se fora realmente avaliada, causa-nos preocupação as cabeças responsáveis pelo estudo de nossa segurança.

Alguns estudiosos têm de compreender que a gravidade da questão envolvendo o tráfico de drogas, é extremamente complexa. Não se resolve com ações guiadas por ideologias. Deve ser analisada numa dimensão cultural e social. Não basta evitar que o indivíduo tenha contato com os criminosos na prisão, forçando-os a penas alternativas. A probabilidade de se afastar alguém do tráfico, pequeno, médio ou grande nestes termos é quase nula, pois fora da prisão também existem cooptadores para o tráfico em todas as escalas.

Ao voltar para seu meio, o autor da infração continuará na mesma atmosfera violenta e sem expectativa. O que ele viu e ouviu durante o seu período de cumprimento de pena alternativa será igual a zero, ao se deparar com as velhas dificuldades e as mesmas “amizades”. Pelo que já presenciei, até imagino o pensamento do infrator: “traficando leve, nunca serei preso; basta cumprir uns servicinhos para a comunidade e voltar ao trabalho”. É duro, mas é por aí.

Enquanto o Estado não assumir a sua parte, oferecendo medidas agressivas de educação e de caráter social, capazes de influenciar em nossa cultura – e de pouco adianta oceanos de cotas em ensino superior, neste caso –, e se pautar por esses paliativos ad infinitum, o combate ao crime será inócuo e sangrento.

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