quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Ele era um cara tranquilo. Agora está morto

Não tenho tido muito ânimo para escrever, mesmo estando de férias. Ando com a minha rotineira tensão, ainda que de forma extremamente velada. Porém, os últimos acontecimentos me impelem a manifestar. Do contrário, sou capaz de "recuperar" a sanidade e rumar para algum lugar onde ser humano seja algo raro de se cruzar. Quem sabe assim não viveria mais feliz junto a quem amo e poderia criar os filhos ainda por vir?

 

O que me incomoda tanto nesse exato momento não tem a ver com as intrigas do PSDB para ver se Serra ou Aécio vai para o pleito em 2010. Muito menos tem relação com a crise econômica e as inseguranças dos EUA – por extensão, do mundo. Sequer é sobre mr. Lula e seu governo doidivanas quando o assunto é política externa – realidade, muitos outros assuntos parecem deixar o noço presidente e sua trupe abestalhados.

 

Volto-me para a morte de Sidney Fonseca Oliveira, um cidadão simples, anônimo e batalhador em meio à selva urbana. Li ontem que ele partiu após ser baleado na noite de domingo, juntamente com um colega, próximo a sua casa. Seu colega partira um dia antes. Levou um tiro nas nádegas, que por uma jogada abjeta do destino desviou e alcançou alguns órgãos vitais, causando-lhe hemorragia interna. Não, nenhum dos dois estava envolvido com atividades criminosas. Isso era sabido por todos do bairro. Sidney era pedreiro, mergulhador e já surfou bastante no passado. O colega, vigilante. Contudo estão mortos. Aos fatos.

 

Na noite de domingo saí juntamente com minha esposa para uma lanchonete no bairro vizinho, algo em torno 300 metros de minha residência. Parecia apenas mais uma noite do 1° dia da semana: os fiéis retornando de seus templos, moradores na calçada de casa e suas triviais conversas, crianças, jovens e adultos transitando com a tranqüilidade costumeira d'uma periferia, somente quebrada por acertos entre os amantes da violência. E ela foi interrompida, violentada barbaramente na noite de domingo do dia 15.02.2009.

 

Acabava de acertar a conta com o dono da lanchonete, quando ouvimos uma rajada de 20 estampidos numa sequência crucial. Bem, eram pouco mais de 9 horas da noite e a rua estava cheia. Aguardo um instante e em seguida olho com certo receio em direção do que, sinceramente, não sabíamos se tratar de tiros ou mais uma arruaça da molecada – as tais "bombinhas" de festas juninas ou "tiros" emitidos pelos canos de descarga das motos dos jovens que desejam chamar a atenção. Avisto uma multidão a uns 150 metros, do outro lado da ponte que separa o bairro onde resido, Santa Rita, do bairro onde está localizado a lanchonete.

 

À medida que me aproximo da multidão, pela experiência mórbida oferecida na maioria das periferias do Brasil, já sei tratar-se de algo além de simples molecagem. Era um ato celerado, indignante. Paro junto a uma barraca de hot dog de um amigo. As informações são um tanto desencontradas, como é normal nessas situações. Pouco a pouco os fatos em si tomam forma.

 

Tratava-se de uma moto e dois homicidas com uma missão: o terror. Conforme os relatos, os criminosos atacaram uma residência para acertar contas. Feriram gravemente um jovem e uma mulher. Em seguida, resolveram sair atirando pelo bairro. Acertaram uma senhora e um jovem, até alcançarem Sidney e seu colega, que tinham como único pecado estarem na mira de criaturas ignóbeis.

 

Sidney, também era Siri, um dos surfistas do bairro. Nunca tive amizade com ele. Trocamos poucas palavras durante sua existência, mas era o tipo de pessoa pacata da periferia, cordial; sempre nos cumprimentávamos quando nossos caminhos se cruzavam pelas ruas irregulares e poeirentas do bairro. O vi pela última vez há uns dois meses, creio. Assim como muitos outros moradores fiquei chocado e revoltado com o ato naquela noite de domingo.

 

Contudo, como um amigo que estava próximo ao local do ocorrido nos disse tê-lo visto sóbrio logo após o atentado, imaginei que tudo passaria de um susto. Hoje tornou-se um pesadelo, que fica na memória dos habitantes de Santa Rita. A loucura que habita as almas responsáveis por esses atos grotescos, ainda os levou na manhã de segunda-feira ao local onde assassinaram os dois colegas e atirarem contra um funcionário de uma farmácia que aguardava o patrão para abrir o estabelecimento. Poderia ser surreal se não fosse dilaceradamente a realidade.

 

Siri, o cidadão anônimo partiu. Não haverá comoção nacional, nem protesto contra a violência gravado e transmitido em horário nobre. Apenas um grande pesar no coração de quem só deseja um mínimo de paz, além de uma dor indescritível para os entes queridos de mais uma vítima da torpeza humana.

 

Ele era apenas mais um cara tranqüilo. E agora jaz numa cova qualquer por conta do desprezo humano pela vida.



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